segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Arte, Infância e Formação de Professores: Autoria e Transgressão.





OSTETTO, Luciana Esmeralda; LEITE, Maria Isabel. Arte, infância e formação de professores: autoria e transgressãoCampinas: Papirus, 2004.
As autoras, pedagogas de formação, encontram na arte pontos de aproximação e nesse olhar discutem e discorrem em seus textos acerca de educação estética, na perspectiva do sabor e da descoberta: a descoberta do outro em que se reflete a busca da produção e apropriação de sentidos.
No primeiro artigo, Luciana e Maria Isabel partilham experiências realizadas no Sul e no Sudeste do Brasil, trabalhos com professores em torno da arte, como uma chamada ao diálogo. O artigo “Formação de professores: o convite da arte” pretende fazer pensar, instigar o olhar, desestabilizar o estabelecido. Isso tudo de modo a ampliar os fundamentos essenciais para a formação do professor e propor o convite da arte na perspectiva do desafio. Ao falar de saberes, as autoras buscam provocar a dimensão inventiva desvinculada da “queixa-revelação eu não sei fazer”(p.17), destacando a importância de reinventar o cotidiano, expandindo o repertório do fazer educacional. Enfim, buscam entender a relação conflituosa entre a produção artístico-cultural e as instituições educacionais: a arte pautada na transgressão em contraposição à normatização da instituição escolar.

A criança vista como a grande protagonista, e da qual são consideradas ações fundamentais a expressão e a observação, é a experiência italiana na qual Maria Isabel se baseia para a escritura do texto “Linguagens e autoria: Registro, cotidiano e expressão”. São reflexões acerca da importância do registro como instrumento de partilha, troca e significação na formação de crianças e adultos, nas quais se destaca o envolvimento da qualidade estética e do prazer, com atenção para o como a criança faz. Na cultura da infância, “o registro e o respeito às expressões de cada um são, sobretudo, possibilidades de preservação da memória” (p.32). Nessa perspectiva, partilhar experiências vividas significa que ao serem registradas passam a fazer parte da história, difundindo o conhecimento sobre a infância.

No artigo “Mas as crianças gostam! Ou sobre gostos e repertórios musicais”, Ostetto chama a atenção e lança a provocação: “gosto se discute?”. Alerta para os gostos e repertórios musicais presentes no cotidiano educativo, lembra que “atrás de um gosto há sempre um sujeito, uma história, práticas culturais” (p.41). Como será o repertório e o conhecimento musical dos professores que atuam na educação infantil? Que questionamentos podem ser trazidos à tona e o que pode revelar esse gosto? Cabe aos educadores proporcionar outros caminhos, traçar saberes, questionamentos, críticas, dar poderes à imaginação para que as crianças conheçam outros repertórios e assim possam formar um novo gosto. Construir sentidos e significados outros, contribuindo para a diversidade no processo de ensino e aprendizagem.
Parte da tese de doutorado de Leite, “A criança desenha ou o desenho criança? A ressignificação da expressão plástica de crianças e a discussão crítica do papel da escrita em seus desenhos”é um texto que traz à tona algumas concepções acerca do desenho infantil: a necessidade de registros de escrita no desenho. A autora observou uma amostra de desenhos elaborados por meninos e meninas durante a exposição de Salvador Dali, realizada no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Como se deu o processo de criação? Qual a dimensão estética e poética dos desenhos elaborados pelas crianças? “Há vários olhares possíveis sobre o tema, (...), desenhos de crianças são possibilidades de transbordamento, de fruição, de jogo e de prazer” (p.69).

Em “Do cinzento ao multicolorido: linguagem oral, linguagem escrita e prática pedagógica na educação infantil”, Ostetto chama a música e a poesia de Marisa Monte e Gentileza para uma conversa sobre linguagens, imaginação e prática pedagógica na educação infantil. A autora defende que é na dimensão interativa do diálogo que poderemos contribuir para um salto qualitativo ao criarmos espaços e momentos de interlocução e criação com as crianças. Para a significativa descoberta da beleza e o despertar da imaginação, o cultivo do afeto, da sensibilidade na busca do conhecimento - existem muitos caminhos a seguir.

“Educação e cinema: um recorte sobre o papel cultural dos festivais” um recorte da pesquisa de Leite, é elaborado com base em entrevistas realizadas durante o 31º Festival de Cinema de Gramado. Na interface entre a arte que por si pressupõe a transgressão e o devaneio, em relação às questões pedagogizadas na normatização da escola, o que fica ao término da mostra? “Que papel o festival assume diante da possibilidade de apropriação e produção cultural do cidadão gramadense, em especial alunos e professores?” (p.98). Paralela à grande mostra, acontece uma mostra infantil. Que concepção de infância é então explicitada?
Ostetto apresenta imagens de educadoras e bebês no artigo: “Dos gestos na educação infantil: textos do corpo”. A sensibilidade e o olhar de descoberta do educador acerca de seus fazeres e saberes sensíveis, a linguagem do corpo é fotografada e aqui revelada. Que corpo é esse que se entrega ao observador/leitor? Que história conta um corpo? Numa multiplicidade de leituras, inúmeros sentidos podem ser construídos, outras imagens podem ser recriadas e projetadas, na dinâmica dos movimentos, no sonho de dançar a educação: uma dança de participação e celebração – círculo, roda, dança. Um universo de possibilidades expressivas se estenderia ao “ser educador” que habita o ser da poesia, da dança para além do cotidiano educativo.
Os textos, estudos e ensaios aqui reunidos invocam a construção de significados. Pontuam modos de recepção e apropriação seja na formação do professor, no registro do cotidiano educacional, na descoberta do gosto musical, no desenho da criança, nas descobertas com o cinema ou nos gestos da educação infantil, suscitam mudanças no campo do conhecimento das relações entre arte e a educação em tempos e espaços diversos.

O vivido na arte, na infância e na formação de professores elucida a autoria e a transgressão. Traz à tona questões atuais da educação estética numa tessitura de conceitos e sentidos múltiplos.

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